terça-feira, 10 de setembro de 2019

Mito da caserna

Homenagem aos capitães do mato
do nosso amado Brazil


Nascido o mito carioca em São Paulo
brotado então de puro ventre
filho de Perséfones e Têmis
primeiro após Temer
último após os robôs lisérgicos
fruto da urna envenenada em sangue.

Erigido líder dos paraíbas e do resto
feito lágrima enganada em solo duro e amargo
brotada ao responder às mais obscuras e recônditas vontades em si guardadas
ao inventar seu panteão imaginário
à verdade que apenas a si acredita e ilude.

Mito da caverna
o Grande Mito Nacional cedo pendurava a botina
eleito na caserna ao status de Gogó-Geral da República
com mandato em Brasília, vitalício e hereditário
arauto da ética sob o curral, a alfafa e o chumbo.

Irretocável sua ferradura que fora sorte e semente
de genocidas frente ao medo
das armas frente à impotência
e da tortura diante da inépcia tão típica dos incapazes.

Cavalgou voraz sua batalha e seu sonho
plantando no Estado sua árvore cítrica e hereditária 
acima, abaixo e ao meio
plantada em cortina de fumaça
logorreia e careta. 


Nada novo além do céu e da amaurose
Zeus para dar vida e controlar a divindade
deus mercado para animar o circo
deus superego para torturar o sofrimento alheio, e tão somente o alheio
deus’emprego para afirmar a escravidão anestesiada.

À carioca encena-se tosca tragédia
antagonismo entre a maravilha natural e genética 
e a ferradura sobre o mármore espelhado
para dar-nos sorte
e iludir com lápide consorte.

Revelou-se enfim o sonho de menino
gerado de tão nobre teogonia
a elevadíssima comenda asneira honoris causa
galharda aos egrégios da nação.

Eis as medalhas
ao mouro judeu, dê-nos aJudas
ao pau nos reles
ao general sob o trem-sem-freio
à sinistra da goiabeira
ao professor de escuridão
é ao carbonífero líder faroeste, algoz pioneiro de touro-sentado.

Democrata-defensor-da-ditadura
honesto e audaz larápio-geral 
comedor-de-gente cristão
o Comendador honraria seus agraciados com nióbio secreto
tão valioso a invejar o mais rubio diamante.

Sem ato que chegue ao fim
o faminto da caserna sofre
- Não nasci para isso, não tenho noção
triste nação.

Eis-nos em fado francês
cantado com ovos na goela abaixo
em pele & pelo loiro à Tiffany e base brega

novaioquines, como não poderia deixar de ser.

sábado, 2 de março de 2019

Romance para tua canção de partida




I – os males dos sonhos

- Dê a outra face, alerta o Messias acolá,
defronte o sonhador que possui tantas faces
quantas misérias no mundo há.

Eis que se acabam as peles em lema,
então se entregam o dorso, o tórax,
os genitais, os membros, os pudores e a calma,
até que os desejos interiores mínguem
exaurindo por completo a própria alma.

Os ímpetos por um século a mais e melhor
fazem dos humanos seres de luta,
muitas vezes restando em direitos
outras tanto levando ao luto.


II – o poema antigo e tão moderno

Mãe, outrora eu tivera elogios aos meus desenhos
da maior fomentadora da minha criatividade.
Espirro de liberdade.

As coisas afastaram nossas evoluções de vida.
E o centímetro que nos separava
isolou meu crescimento e sua presença.

A primeira barbinha chata, motivo de vergonha;
A primeira namorada – creio que até hoje nenhuma delas conhecestes;
A evolução no colégio,
Os insucessos – fracassos ainda não os tive, quero que saibas;
Minhas virtudes e meus defeitos.

Mãe, atribuo-lhe minha poesia toda.
Se meu pai é minha herança de razão,
Só de ti pode ter vindo minha sensibilidade chorona.

Se tua ausência me foi estímulo de maturidade,
Tua ausência também significou minha insegurança.
Se tua ausência me foi motivo de responsabilidade,
Tua ausência também foi as paredes de minha insociabilidade.

Mãe, creio que escreverei até minha morte.
E um verso eu farei tão lindo à beira dos céus,
Que morrerei antes de angústia por não dá-lo a ti.
Mas minha poesia é antes tua que de qualquer amor que eu tenha tido.
Só Deus possui mais que ti a arte de abrir-me o coração
E de ajuntar as palavras a exprimir.

Herança de milhares de letras tu terás,
E de milhares de sentimentos que não soubestes de mim,
Com outros milhares de sentimentos dos outros que descrevi,
Terás à desterrada cognição humana.

Mãe, tua ausência me fez saudades.
Tua espera me fez impaciente,
Mas aprendi a ser forte assim.
Mãe, sou fraco por ti, mas te amarei com força,
Daquelas dos teus abraços a cada jornada finda.


III – a tua partida

Ponta de areia
Ponto final.
Porto final.
Da Bahia a Minas
Estrada natural.
Caminho de ferro, mandaram arrancar.

Viajaste pela ultima vez
de Minas à Bahia
depois do último natal.
Retornaste, ponto, afinal.

Não lhe posso esquecer, Meu Canto,
por seres, tu,
parte pioneira de mim mesmo,
de meu ar saindo em pranto,
de minha bomba rasgando interna ao peito,
de um sonho por um chão mais belo e encanto,
de uma plateia mais feliz em poesia e som,
de uma mata mais verde e rica em manto,
de um amor mais feliz e acalanto.

És mim mesmo,
gritando socorro na noite derradeira
sem encontrar guarida;
atadas as mãos e os pés.

Foste a natureza inteira degradada,
restando sem garganta ou respiração
ou pulso ao fim exangue,
como Avicennia tombada.

Restam-nos os fatos em preto e branco,
sem esperança, nem sorriso a tudo e a todos;
nem voz fina e afinada de cantante;
nem sonho, nem natureza a montante.

Nem luta por tudo que seja mundo melhor,
nem eu consigo ser se não és mais.
Sabe-se lá por ainda quantos tempos e ais
serão as lembranças de teu cais.

Teu regresso a Minas,
derradeira viagem terrestre,
envolta de flores e lágrimas,
entoou o canto de luto silvestre.


IV – deste ato interminável

Não estás aqui, perto de mim,
mesmo tão presente cantando.
Sendo, contudo, meus sonhos
surreais em beijo de querubim.

Pouco juntos os corpos estiveste, enfim,
bem verdade fosse. Ainda que
nem verdade seja – vou pensando.
Com a língua de saudade e a agonia,
a fotos antigas vão se revelando.


V – das heranças

Tua voz gravada, como tua música,
tua preocupação por nós três distantes e Amados,
está na minha memória para sempre, e teu amor,
tua inspiração para sermos criativos,
felizes,  anti-cativo-livres e brincantes sem dor.

Criaste-me algo poeta,
de futuro desviado à esquerda,
nascendo à natureza de primavera,
com nome de entidade das águas,
criticando o anverso do jornal,
tendo o libretto da ópera abaixo da axila,
um verbo auxiliar, o brado silencioso de Morpheus,
o pranto de Prometeu,
o fluxo dos mares e ventos globais,
sem rima.

Como Noel, tu - filha de Joel,
Não te vejo e nem te escuto.
O meu samba está de luto.
Eu peço o silêncio de um minuto,
à homenagem e à história
de um amor cheio de glória;
por teu silêncio absoluto,
por meu samba de luto.

Ainda, que
Proibiram que eu te amasse.
Proibiram que eu te visse.
Proibam muito mais: preguem avisos,
fechem portas, ponham guisos,
nosso amor perguntará: e dai e dai?

Como Violeta em Elis, tua preferida, agradeço
a ti, que a tudo respondia com GRATIDÃO!!!
Gracias a la vida, que me ha dado tanto.
Me ha dado la risa y me ha dado el llanto.
Así yo distingo dicha de quebranto,
Los dos materiales que forman mi canto.
Y el canto de ustedes que es el mismo canto
Y el canto de todos que es mi propio canto.

Como Vander Lee,
como agora choro e chorinho, incontida e soFridamente,
meu amor, deixa eu chorar até cansar,
me leve pra qualquer lugar
aonde Deus possa me ouvir.

E como Milton, de quem
tenho nos olhos quimeras
com brilho de trinta velas.
Tenho os intestinos roucos.
Os meus músculos são poucos
pra essa rede de intrigas.

Meu sangue de mangue sujo
sobe a custo, a contragosto.
E tudo aquilo que fujo.
Tirou prêmio, aval e posto
Entre hinos e chicanas
Entre dentes, entre dedos
No meio destas bananas
Os meus ódios e meus medos.
E dai? E dai?


VI – a tua obra, criadora

você cresceu demais
tendo passado por dona de casa
com muitas responsabilidades
aprendeu a amar
e viveu tanta amargura por isso

teve de deixar
o pagão amor...
Pianista nega
filha do pastor

ela levantou de seu piano na igreja
que soou... ah

é que minha amiga engravida de seu noivo
excluídos quando ela se rebelou ôôô

ela se excluiu ao seu piano quando a igreja barulhou

que ironia
aquele cara pagão um dia
vira pastor rock and roal

era mi hermanita tão bonita
organita toca teclado
y tambien toca cravo

sabe o quanto é complicado...
tocar é pra quem pode
o resto se sacode
sacudimos búzios e os nossos que se explodam
e esses nossos se explodam

você cresceu demais
a sua infância agora é hoje
e lhe digo como uma adolescente
não leve a vida tanto na filosofia...

sabendo que  quem toca é pra quem pode
e o resto só se sacode
Sabendo que quem toca é pra quem pode
e o resto só se sacode


VII – a tua herança material

As últimas palavras que ouvi de ti,
não, não foram de socorro.
Foram um sonho aguerrido e cansado
que há tempos ousava gritar.
Foi no dia de tua partida.

- É um monte de coisas que eu faço,
minha casa acabou de ser invadida, de novo.
A única coisa que eu tenho feito é plantar,
eu amo.
Eu vim aqui para reflorestar,
de árvore, de tudo.

Todo mundo quer, todo mundo vai querer.
Eu não tô aqui para impor nada a ninguém. Entendeu?
Eles nunca quiseram montar associação, nem nada.
Mas a gente vai precisar sim se a gente quiser fazer alguma coisa.
Graças a Deus estamos vivos e ainda podemos fazer.

E assim viva permanecerá,
astuta memória,
de dignas mulheres da história
a ensinar que amanhecerá.


VIII – da tua foto revelada

Rô Conceição, mãe,
não poderia o final ser feliz, meu amor.
Não aqui, afinal, não neste tempo,
filho da iniquidade e do terror.

Aliás,
esta ópera é interminada,
Turandot não descobrirá Calaf,
Nessun dorma eternamente!
Não neste teatro quase esférico
deste plano sem alfa e nem ômega, histérico.

Apenas as cores da natureza,
o ecoar da canção,
a estética incólume e sem ética,
os versos que restam,
poderiam sugerir as linhas de tua foto.

Não de teu corpo violado em chão indigno,
de tua memória violentada,
contrapodo tua armadura de sorrisos frente à bala seca.
Não de teu mangue dragado e ressecado,
de tua morada invadida e silenciada.

Mas sim de tua glória e reação digna
frente ao ódio e à repressão,
deste mundo iludido em papel verde tingido,
físico ou não, fato ou fingido.

De tua simplicidade frente ao ouro,
teu corpo magro  e boca fechada ao couro
despeite o banquete famélico,
e grito no mando de silêncio homérico.

Apenas as flores eretas,
confronte à correnteza,
e o som da revolução poderiam.
A beleza virá-mundo em ubíquo pão,
os versos que restam aos poetas,
poderiam sugerir-te a face em filme e canção.
Neste tempo e neste mundo não.