segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Seres de Marte




A cidade não pára
e os homens a imitam,
sem saber que suas veias
tornam-se autopistas;
sem saber que seu sangue
torna-se esgoto;
sem saber que seus ossos
se tornam edifícios financeiros.

A madrugada se torna desafogo de metas,
cujas estipulações são ditadas por máquinas
e fiscalizadas por homens robotizados.

Tudo bem,
a economia não pode parar,
pois logo seremos dez bilhões.
Enquanto alguns mil concentram o molho de tomate,
porque a economia é de apetite voraz
e só come à francesa,
outros bilhões bebem, comem, inspiram e piram
o lixo que sai das indústrias.

O mundo, o planeta – “o globo”,
para se adestrar aos termos da globalização,
recebe rins, pulmões e cérebro:
rins de Marte, que não polui seus líquidos;
pulmões de Marte, que não fuma chaminés;
cérebro de Marte, coitado!, que não tem
civilização inteligente para utilizá-lo.

Tudo de Marte.
Até porque lá o Chaplin ainda não nasceu
e os tempos ainda não são modernos.

Ah, Marte! Suas cidades ainda têm noites!
Sua economia não vale mais que a vida!
Até porque seus habitantes ainda são verdes.

Marte, oh, Marte!
Sua “Destruição Criadora” ainda não cuida dos homens, criando-os ao destruí-los,
cambiando-os por um chip mais evoluído.

Marte, vermelho de seres subdesenvolvidos,
seus seres inferiores –vulgo animais – não são como os daqui,
que olham para os seus donos,
pensando que qualquer bípede
é adestrado por uma doutrina artificial.
Seus seres não condescendem sentir pena de seus dominantes.

Planeta Cifrão



Você se defende
Eu me protejo.
Você mostra fraqueza
Eu ostento minhas armas.

E chega de ponderação...
Ah, vida de confusão!
Sabe-se que paz é sonho
E que o amor uma combustão.

E terminaremos humanos,
Desumanos destruidores de um planeta,
Dos sentimentos desse planeta,
Da diversão das espécies noturnas.

Tudo isso pra mostrar que se pode ser mais rico!
Quem quer mostrar ser mais bobo?
Ah, prefiro o título de mais poeta,
Prefiro aquele que diz: véio, c ta podre!

                                       16/01/2007

Versos talassoflúvios



O amor é como um rio:
Por toda a vida corre;
Quando deságua no mar
Sente o tédio das calmarias
E os tormentos das tempestades.

Desejo




Desta carta, poema - que seja,
santos e santas,
demônios e hormônios brotam desvairados.

Aproveitando o ensejo,
segue anexo o desejo,
do qual falar não o fiz,
mas sentir o senti, sem ti.

Matinada sem rumo,
vão os desvalidos nas ruas
e minha mente no teu corpo álamo.

Amotinada mente, seguem nuas,
indecentes, a lua e as tuas
nascentes folhas
 ao caos do tálamo.

Aproveitando o beijo,
vai sem nexo o desejo,
e nem sexo lampejo
que a língua não viu,
mas querer o quis, se quis.

Das profundezas,
o mar surgiu ao toque.
E ao torque da pele ao pelo,
pela mão que embeve o selo,
golfo faz-se enfim delfim.

Afinal, por amar demais,
o herói ao mar caiu.
Consumiu-se golfinho
e, tênue carinho, sumiu.

Instante a marca surge ao dente,
o grito de amor a dor pariu.

Fia o fio a doce vida
e das peles via a fita
dos olhos que sonhei – bonita.

Seduz a boca a faca e o queijo;
na chama sonha a boca o beijo
 do sabor de porvir.

Matinar seduz a boca;
no mar a chuva louca.
Pariu desejo, e oca fé almejo
para o véu cantar desejo.
15/08/11

Beija-flor




O beija-flor procurava bromélias,
As mais sinceras de açúcar,
As mais lindas e suculentas flores.

Pássaro maldito!
Malfadado bico tem!
Achou três pontas de açúcar
E quatro gotas de veneno floral.

Seu caminho traçou como voador hábil,
Levando os polens às flores amadas
E a elas beijando como princesas.

Ainda novo, concluiu ele que sua conduta,
Sincera, romântica e de respeito,
Levaria seu nome ao beijo da bromélia dos seus sonhos.

Mas o fato vós já sabeis: quatro gotas de veneno
Após três beijos de mel e sonho.

Aos beijos ele morria e renascia,
Como quem pára no ar mesmo que o ar o falte.
Aos beijos ele perdia a hora e a hora o perdia,
Como quem esquecesse o resto,
Mesmo que o resto não o esquecesse.

Morreu o beija-flor...
Mas viveu como ninguém
As três pontas de mel floral.
Viveu a vida inteira,
Porque a vida do beija-flor
Só é vida se há mel e dor...